Num canto qualquer de uma padaria, entre o cheiro do café passado e o burburinho matinal, seu Raimundo dobrava com cuidado o papelzinho onde anotara seus números da Lotofácil 3265. Aquela era sua rotina sagrada, quase como uma oração diária. Não era sobre ganhar ou perder, pensava ele, mas sobre manter viva a chama do “e se”.

A loteria no Brasil é quase uma instituição cultural. Desde os tempos em que minha avó se reunia com as amigas para discutir os números sorteados no rádio, até as rodas de conversa nos grupos de WhatsApp hoje em dia, ela sempre esteve lá, como um personagem constante na trama da vida cotidiana.

Os números da Lotofácil 3265 eram mais do que simples algarismos. Representavam as expectativas de muitos brasileiros, desde o sonho da casa própria até aquela viagem adiada há tanto tempo. E, claro, não podiam faltar os palpites certeiros dos “entendidos”, que juravam ter um método infalível para decifrar o enigma dos vencedores.

Na fila da lotérica, dona Cleusa contava sua história pela enésima vez. Tinha certeza de que aquele seria seu ano. Trazia na memória o relato do vizinho que, anos atrás, levou para casa um prêmio modesto. Com o dinheiro, reformou a casa e fez uma festa que ainda é lembrada na rua até hoje. “É assim mesmo”, dizia ela, “um dia é você, no outro pode ser eu”.

Eram histórias assim que alimentavam a fé de tantos outros. Entre risos e suspiros, alguém sempre tinha uma história de quase vitória para contar. E mesmo quando o azar parecia eterno, ninguém perdia o bom humor. Afinal, como dizem por aí, “azar no jogo, sorte no amor”.

Quando finalmente saiu o resultado do concurso 3265, seu Raimundo conferiu seus números com um misto de expectativa e resignação. Não foi dessa vez. Mas ele sabia que amanhã haveria um novo papelzinho esperando para ser preenchido com sonhos e esperanças.

Porque no fundo, a mágica da loteria não está apenas no prêmio, mas na possibilidade constante de sonhar com um futuro melhor. E isso, ah isso nenhum bilhete pode comprar.